«Os
jogadores»
Pequeno conto publicado na rubrica «Gavetas do Tempo» do jornal «O Comércio
do Porto»
- Passo!
- Pago para ver!
Com os olhos parados, num gesto lento, quase
contido, o segundo parceiro estendeu as suas cartas, uma a uma, sobre
o verde espraiado da mesa de jogo.
- Sequência de Ás...
- Poker de noves!
No terceiro jogador, por uns segundos, perpassou
o frémito da vitória; para logo se extinguir num displicente «quem dá?»,
enquanto a sua mão buscava, silenciosa mas ostensivamente, as fichas coloridas
que as apostas tinham amontoado ao centro da mesa.
No ambiente familiar e agradavelmente saturado
pelo fumo e vapor dos whiskies, as cartas, baralhadas com mestria, cantaram
pela vigésima vez; para logo o baralho quase se desfazer repartido pelos
três.
Rei... Dama... Ás... Dama... Valete...
Depois de um breve segundo de hesitação,
imperceptível, o terceiro jogador, fingindo dar pouca importância ao facto,
avisou: - Não quero nenhuma.
Os parceiros ergueram simultaneamente os
olhos, que enterraram no seu facies imperturbável, como que à espera que
dele escapasse um sinal, uma denúncia de bluff.
- Duas para mim.
- Três.
Substituídas as cartas pedidas, iniciou-se
a segunda rodada de apostas. Num esforço de desprendimento, o terceiro
jogador, o último a apostar, sugeriu, esboçando um sorriso que propositadamente
compôs com um ar de falsa provocação:
- Tudo ou nada?